Avaliação do escape aéreo durante o desmame ventilatório: "Cuff Leak Test"
Autor: Daniel Machado
CREFITO:
Cidade: São Paulo
Estado: SP
Email: machado.daniel@ig.com.br
Instituição: Hospital Santa Cruz
Orientador: Sérgio Luís Cabral Medeiros

Introdução: A ventilação mecânica apesar de ser uma intervenção terapêutica fundamental no paciente com insuficiência respiratória aguda e obter alto percentual de aplicação em pacientes internados em unidades de terapia intensiva, é um procedimento invasivo não isento de complicações o que torna oportuno o rápido reconhecimento da reversibilidade do processo agudo e o retorno à ventilação espontânea. Os riscos relacionados à ventilação mecânica incluem pneumonia associada à ventilação mecânica, barotrauma e complicações laringotraqueais associadas à intubação e/ou traqueostomia. Estas complicações variam em intensidade de acordo com a doença de base, o tempo de permanência em prótese respiratória e o modo e técnica ventilatória. As repercussões funcionais e hemodinâmicas estão entre algumas das complicações que motivam a rápida liberação da ventilação artificial10. O processo de transição da ventilação mecânica para a ventilação espontânea denomina-se desmame. O conceito de transição gradual da ventilação mecânica para a espontânea está vinculado a técnicas ventilatórias que permitem ao paciente progressiva readaptação à ventilação espontânea em função da redução dos ciclos de ventilação assistida do ventilador artificial. Trata-se de um termo que faz analogia ao desmame materno-infantil, que por vezes é difícil. Para promover uma linguagem comum à transição da ventilação mecânica para a ventilação espontânea propõe-se o termo desmame. Recomenda-se o termo interrupção da ventilação mecânica para aqueles pacientes que tolerarem um breve período em ventilação espontânea, forem extubados e que se mantiverem, por um período de 24 horas sem necessidade de retornar a ventilação mecânica10. O desmame é difícil nos pacientes que, apesar de submetidos a um programa de treinamento, correção dos distúrbios funcionais e utilização de novas técnicas ventilatórias, não conseguirem se manter em ventilação espontânea. Um grupo intermediário engloba os pacientes cujo processo será gradativo (desmame gradual), seja por não tolerarem o breve período em ventilação espontânea, ou por retornarem à ventilação mecânica no período de 24 horas. O desmame e extubação certamente é o principal objetivo após qualquer situação que exija uma intubação oro-traqueal. Vários são os protocolos de desmame, não havendo ainda uma conclusão definitiva sobre o melhor método 2,3,8. Porém todos os métodos devem envolver as seguintes fases:

Apesar de todos os cuidados a avaliação da capacidade do paciente em ventilar-se espontaneamente, o processo de desmame e extubação ainda não é perfeito e apresenta incidência de 3 a 19% de falha e consecutiva necessidade de reintubação por diversos motivos5, Ocorre que os pacientes que necessitam de reintubação tem um grande aumento em fatores de risco ligados a intubação oro-traqueal e pioram consideravelmente seu prognóstico. O risco de pneumonia nosocomial aumenta, um estudo avaliou 40 pacientes que necessitaram de reintubação, destes 19 pacientes, ou seja, 47% desenvolveram pneumonia nosocomial, contra 4 pacientes (10%), que não necessitaram de reintubação e desenvolveram pneumonia nosocomial durante o período de internação18. A mortalidade entre os pacientes que necessitaram de reintubação excede a taxa de 30 a 40% 5,6. Portanto é de fundamental importância o estudo dos fatores que mantém a presença de um percentual de falha no desmame da ventilação mecânica com consecutiva reintubação. Dentre os fatores que podem causar insucesso de um desmame estão as complicações e conseqüências da própria intubação oro-traqueal, naso-traqueal ou traqueostomia.

 

 Objeto: O preente estudo  estudo se limita as conseqüências que as lesões laringotraqueais evidenciadas por: edema, inflamação e ulceração de mucosa, decorrentes da intubação oro-traqueal11 podem causar no processo de desmame da ventilação mecânica, uma vez que um estudo publicado em 1981 identificou a prevalência de 3% em um total de 226 intubações oro-traqueais, com edema de glote e laringo-espasmo no momento da intubação17. O edema de glote e o laringo-espasmo são fatores que contribuem para necessidade de reintubação16. Portanto, sugerimos que medidas que possam identificar estas ocorrências devem ser fomentadas a fim de diminuir o índice de insucesso de desmame e falha de extubação. A verificação de sinais flogisticos na glote, laringe e traquéia seria de grande valia na identificação de possíveis lesões, porém haveria a necessidade de inclusão de métodos endoscópicos de diagnóstico que implicariam vos valores de manutenção e complexidade deste processo. Foi descrito um teste que pode prever a ocorrência de edema de glote e conseqüente falha de extubação através do escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal, porém sua utilização não é universalmente preconizada7. O escape aéreo menor que 10% do volume expiratório total é útil para identificar o risco de edema de glote e/ou necessidade de reintubação, bem como eleger quais pacientes necessitam de tratamento prévio a extubação 15,16. Nossa proposta é de utilizar o teste de escape aéreo após desinsulflação do "cuff" endo-traqueal (Cuff Leak Test) como medida preditiva de insucesso de desmame e falha de extubação.

 

Material e método: A pesquisa foi realizada na unidade de tratamento intensivo (UTI) geral, do hospital Santa Cruz (São Paulo - SP), que conta com 12 leitos, no período de Fevereiro a Maio de 2.003, sob aprovação do comitê de ética e diretoria clínica do hospital. Eram incluídos na pesquisa os pacientes submetidos a intubação oro-traqueal (IOT) por qualquer natureza etiológica sem distinção de sexo ou raça, somente era necessária a permanência de intubação oro-traqueal por mais de 72 horas. Foram excluídos os pacientes com período de intubação oro-traqueal menor que 72 horas e/ou pacientes que fossem submetidos à traqueostomia. Também eram excluídos pacientes que apresentassem patologias que acometessem a traquéia e laringe, pacientes menores de 18 anos de idade e pacientes que fizessem uso crônico de corticóides. Todos os pacientes eram submetidos a IOT por profissionais médicos com larga experiência neste procedimento. As cânulas oro-traqueais (COT) utilizadas possuíam entre 7,5 e 8,5 mm de diâmetro interno e todas eram dotadas de balonetes (cuff) de alto volume e baixa pressão. A ventilação mecânica era realizada pelos aparelhos da marca TAKAOKA modelo Monterey e BIRD modelo 6400 com humidificadores da marca GIBECK modelo Humid-Vent 150-1000ml. A pressão intra "cuff" não foi mensurada em nenhum dos pacientes durante todo o período de internação, apesar de ser uma rotina indicada a qualquer serviço de tratamento intensivo, esta não fez parte de nossa pesquisa. Assim que admitidos na UTI, todos os pacientes recebem regularmente tratamento fisioterapeutico e diariamente eram avaliados quanto à possibilidade de desmame da ventilação mecânica pela equipe de fisioterapia do hospital e pela equipe de fisioterapia do grupo de especialização em fisioterapia intensiva, em conjunto com o médico plantonista. A avaliação da possibilidade de desmame era realizada conforme preconiza o II Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica (2000) e as condições para tal ação estão descritas no quadro (1). Assim que todos os níveis requeridos se apresentassem em faixa de tolerância, era iniciado o desmame sempre com modalidade ventilatória de (PSV) Ventilação com Pressão Suporte, associada a (PEEP) Pressão Positiva ao Final da Expiração. Os parâmetros de ventilação eram progressivamente reduzidos conforme os sinais de tolerância do paciente até que fossem alcançados valores tão baixos quanto: Pressão Suporte de 10 cmH2O, peep 5 cmH2O e FiO2 de 40%. Nesta fase do desmame da ventilação mecânica, eram realizadas constantes reavaliações quanto à intolerância do paciente ao desmame conforme quadro (2).

Parâmetros

Níveis Requeridos

Evento agudo que motivou a ventilação mecânica

Reversibilidade do processo

Presença de drive respiratório

Sim

Avaliação hemodinâmica

Correção ou estabilização do débito cardíaco

Drogas vasoativas ou agentes sedativos

Com doses mínimas

Equilíbrio ácido-base

pH> 7,30 e < 7,60

Troca gasosa pulmonar

PaO2 > 60mmHg com FiO2 <40% e peep < 5 cmH2O

Balanço hídrico

Correção de sobrecarga hídrica

Eletrólitos séricos

Valores normais

Intervenção cirúrgica próxima

Não

(Quadro 1 – Condições para considerar o desmame da ventilação mecânica – J. Pmeumol. 26 supl. 2 – pg.55. 2000)

Parâmetros

Intolerância

Freqüência Respiratória

> 35 ipm

SatO2

<90%

Freqüência cardíaca

> 140 bpm

Pressão arterial sistólica

> 180 mmHg e/ou < 90 mmHg

Sinais e sintomas

Agitação, sudorese, alteração da consciência

(Quadro 2 – Sinais de Intolerância à desconexão da ventilação mecânica – J. Pmeumol. 26 supl. 2 – pg.57 2000)

Tendo tolerado o desmame nestes parâmetros por tempo superior a 1 hora era realizada a fisioterapia respiratória tendo como principais condutas as manobras de higiene brônquica, aspiração de secreções traqueais e orais, assim o paciente era posicionado no leito com o decúbito elevado (>50o.) e avaliados os índices preditivos de sucesso de desmame através da ventilometria e da manovacuômetria. Os índices aceitáveis para andamento do desmame e processo de extubação estão descritos no quadro (3).

Parâmetros

Níveis aceitáveis

Volume Corrente

> 5 ml/Kg

Freqüência respiratória

< 35 ipm

Pressão inspiratória máxima (Pimáx)

< - 25 cmH2O

Índice de Tobin (Fr/Vt)

< 105

(Quadro 3 – Avaliação de índices preditivos para o desmame – J. Pmeumol. 26 supl. 2 – pg.56 2000)

Logo após a mensuração destes índices era realizada a avaliação do escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal, esta avaliação era realizada somente por profissionais envolvidos com a pesquisa ou por profissionais do grupo de especialização em fisioterapia intensiva que receberam treinamento dirigido para tal procedimento. Assim que coletados os índices preditivos de sucesso de desmame descritos no quadro (3) e no caso de apresentarem-se de acordo com parâmetros aceitáveis para extubação, bem como, o paciente apresentasse tolerância ao processo, era solicitada a avaliação médica e a autorização para extubação, somente os dados casuais eram informados ao médico plantonista da UTI, e o mesmo tomava suas decisões sem a informação do resultado da avaliação do escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal. Caso o paciente apresentasse níveis abaixo da normalidade ou intolerância ao desmame da ventilação mecânica, os parâmetros de ventilação eram retrocedidos até níveis ou modalidade que oferecesse conforto ao paciente e o mesmo aguardava 24 horas para início de nova avaliação e testes. "CUFF LEAK TEST": Durante o procedimento de ventilometria, após a mensuração do volume minuto do paciente, era realizada a mensuração do escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endotraqueal era desinsulflado através de sua válvula com uma seringa e então era conectada a cânula oro-traqueal no ventilômetro e mensurado o volume expiratório durante 6 respirações normais denominado (Vcuff). Em seguida o "cuff" endo-traqueal era re-insulflado e iniciado o processo de extubação. O valor de (Vcuff) era então comparado ao valor da ventilômetria realizada antes da desinsulflação do "cuff" endo-traqueal que demonstrava os valores de volume minuto (VM) e freqüência respiratória (FR), e através da fórmula (VC – Vcuff)/VC.100. Assim era determinado o valor percentual de escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal 15. EXTUBAÇÃO: Logo que estabelecida a ventilação espontânea os pacientes recebiam máscara de macro nebulização de oxigênio com fluxo de 5l/min., e eram acompanhados durante 48 horas para possíveis sinais de intolerância a ventilação espontânea, definidos como: ausculta pulmonar com presença de cornagem, desconforto respiratório (taquidispnéia + utilização de musculatura acessória à respiração) e conseqüente necessidade de ventilação mecânica não invasiva e/ou re-intubação oro-traqueal.

Análise dos dados : Todos os dados dos pacientes eram registrados através de uma ficha de avaliação onde eram registrados os principais dados do paciente, seu diagnóstico, datas de internação, intubação e extubação, resultados de exames e os resultados dos testes de ventilometria, manovacuômetria bem como, índice percentual de escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal. Após a extubação os pacientes eram considerados em relação ao valor do escape aéreo. Os pacientes que apresentassem percentual de escape menor que 10% eram integrados ao grupo 1 (G1) e os que apresentassem escape maior que 10% eram integrados ao grupo 2 (G2).

Resultado: Ao total foram selecionados 09 pacientes para realização do trabalho, porém 04 (45%), foram excluídos devido apresentarem falhas do ponto de vista relacionado aos critérios de inclusão como demonstra o quadro (4). Os 05 pacientes inclusos somaram 55% do total de pacientes e não apresentaram nenhuma inconsistência relacionada aos critérios de inclusão e exclusão. Suas características estão apresentadas no quadro (5). Os motivos das intubações oro-traqueais dividiram-se entre duas causas distintas, sendo insuficiência respiratória aguda (IRpA) ou por motivo de cirurgia, a IRpA prevaleceu com um número de 3 intubações contra 2 intubações por motivos cirúrgicos. A patologia mais freqüente neste grupo foi a broncopneumonia (BCP) acometendo 4 pacientes (80%). O período de intubação e ventilação mecânica variou entre 4 e 18 dias obtendo uma média de 10,4 dias.

Paciente

Motivo da exclusão

1

Período de IOT < 72hs. + Presença de patologia que acometeu a laringe (POI de cervicotomia exploradora + tireoidectomia

2

Não foi extubada devido índice de Tobin > 105

3

Paciente extubada com índice de Tobin > 105

4

Período de IOT < 72 hs

(Quadro 4 – Pacientes Excluídos)

Paciente

Idade

Sexo

H.D.

Motivo IOT

No. COT

Período IOT

1

62

F

PO PTQ + AVCI + BCP

Cirúgico

7,5

11 dias

2

43

M

Pancreatite necrohemorrágica

IRpA

8,5

18 dias

3

84

F

Seqüela AVCI + BCP

IRpA

8

14 dias

4

78

M

HDB + Chq. Hipovolemico+ PO Retosegmoidectomia

Cirúrgico

8

04 dias

5

91

F

BCP + Sepse + Alzheimer

IRpA

8

05 dias

(Quadro 5 – Características Gerais dos Pacientes)

A avaliação pré-extubação demonstrou que todos os pacientes inclusos apresentaram-se de acordo com os parâmetros para início de desmame, conforme o quadro (1) e os níveis requeridos para extubação conforme o quadro (2). Entre os itens da avaliação um dos mais importantes certamente foi o índice de Tobin que avalia a endurância diafragmática e em todos os casos estudados se apresentou igual ou abaixo de 100, variando entre 32 e 100, com média de 92,6. A pressão inspiratória máxima (Pimáx) também demonstrou resultados satisfatórios girando em torno de - 40 cmH2O a - 80 cmH2O com média de – 50,6 cmH2O. A ausculta pulmonar revelou que entre os 5 pacientes, 3 apresentaram ruídos adventícios pré-extubação, sendo que 2 destes apresentaram roncos esparsos e o restante apresentou estertores crepitantes em hemitórax direito. Todos os exames de gasometria também demonstraram valores dentro da faixa de normalidade. O quadro (6) demonstra os dados colhidos durante a avaliação respiratória e hemodinâmica pré-extubação bem como os resultados dos testes de escape aéreo.

Paciente

1

2

3

4

5

FR

27 ipm

22 ipm

26 ipm

28 ipm

32 ipm

VM

8.111 ml

14.980 ml

10.630 ml

7.960 ml

10.400 ml

VC

300 ml

680 ml

408 ml

284 ml

325 ml

Tobin

90

32

63

100

98

SatO2

96%

95%

93%

96%

96%

PaO2/FiO2

272

176

332

447

312,5

Pimáx

- 80 cmH2O

- 50 cmH2O

- 43 cmH2O

- 40 cmH2O

-40 cmH2O

Pemáx

40 cmH2O

60 cmH2O

41 cmH2O

20 cmH2O

80 cmH2O

FC

70 bpm

87 bpm

110 bpm

108 bpm

60 bpm

PAS

118 mmHg

150 mmHg

180 mmHg

140 mmHg

173 mmHg

PAD

56 mmHg

100 mmHg

100 mmHg

90 mmHg

41 mmHg

Vcuff

365 ml

390 ml

466 ml

120 ml

325 ml

Índice/Escape

0%

42%

0%

57,74%

0%

ReIOT?

Não, porém VMNI por 24hs

Não

Sim IRpa

Sim, após 4 dias por RNC

Sim IRpA

(Quadro 6 – Avaliação Respiratória e Hemodinâmica Pré-extubação)

O teste de escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal ("Cuff Leak Test") demonstrou variação entre 0 e 57,74% de escape, com média de 19,94%. Dos 5 pacientes estudados 3 apresentaram escape aéreo de 0% e 2 apresentaram 57,74% e 42%. Sendo assim, dividimos neste ponto os pacientes em 2 grupos conforme descrito anteriormente e demonstramos as principais características destes grupos no quadro (7).

 

Grupo 1 (3 pacientes)

Grupo 2 ( 2 pacientes)

Sexo

F

M

Média Idade

79 anos

60,5 anos

Tempo médio de IOT

10 dias

11 dias

Infecção Respiratória

Sim

Não

Re-intubação nas 1as. 48 hs

2

0

(Quadro 7 – Características dos Grupos)

O presente estudo apresentou como resultado a análise de 9 casos de pacientes submetidos a ventilação mecânica invasiva que passaram por processo de desmame, onde somente 5 completaram as exigências para realização do teste de escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal. Talvez esta situação demonstre que este teste deve ser realizado entre os últimos testes da avaliação quanto a possibilidade de extubação, uma vez que outros testes e avaliações clínicas mais difundidas e utilizadas podem por si só abortar o processo de desmame da ventilação mecânica. Este estudo parece ter apresentado uma relação entre a ausência de escape aéreo e a falha de desmame e extubação, uma vez que todos os pacientes que pertenciam ao grupo 1, grupo que tem por característica não apresentar escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal, apresentaram algum grau de desconforto e insuficiência respiratória nas primeiras 48 horas após a extubação, vindo a serem re-intubados 2 entre 3 pacientes dentro deste mesmo prazo. Recentes estudos foram ainda mais precisos e reconheceram que valores de escape aéreo menor que 10% e 12% respectivamente, são de grande valia na identificação de risco e falha de desmame e extubação12,16. Porém nenhum paciente de nosso estudo apresentou ausculta pulmonar mas condizente com a situação de ausência de escape aéreo e possível edema laríngeo após a extubação, ou seja, a ausculta de cornagem ou estridor, característico desta situação e quadro clínico, valendo ressaltar que todas as medidas de avaliação pré-extubação que predizem sucesso em relação a capacidade ventilatória, muscular e pulmonar foram adotadas e todas se demonstraram satisfatórias conforme preconizado pelo II Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica (2000). Talvez outros fatores podem estar relacionados a esta situação como por exemplo, a faixa etária avançada dos pacientes, e também considerar que o grupo 1 apresenta média de idade maior em relação ao grupo 2 em cerca de uma década. Outros estudos recentes que demonstraram resultados positivos em relação a utilização deste teste, também apresentaram entre os pacientes altas faixas etárias, sendo superiores aos 60 anos de idade 15,16. Outro fator a ser considerado é o sexo dos pacientes envolvidos, sendo que o grupo 1 foi constituído ao acaso por pacientes do sexo feminino exclusivamente e o inverso ocorreu com o grupo 2, fato que nos interessou por proporcionar a relação com o estudo realizado em 1996 por HO e colegas que encontraram uma incidência maior de estridor, ou cornagem na ausculta pulmonar após extubação em mulheres. Conforme descrito anteriormente o principal motivo de IOT foi a insuficiência respiratória aguda (IRpA), e esta na maioria das vezes esteve acompanhada de infecções pulmonares. Notavelmente todos os casos de infecção respiratória foram associados a insuficiência respiratória aguda e pertenceram ao grupo 1, grupo de pacientes que necessitaram submeter-se a re-intubação ou necessitaram de assistência ventilatória não invasiva nas primeiras 48 horas após a extubação. Neste estudo não foram encontrados os casos de estridor ou cornagem à ausculta pulmonar após a extubação, porém estudos relacionados a este tema, obtiveram resultados que demonstraram relação alta entre pacientes que apresentassem este tipo de ausculta pulmonar por efeito de edema laríngeo e pacientes que necessitaram de re-intubação12,15,16. Infelizmente o número de pacientes submetidos à reintubação por falha de desmame ou outros motivos ainda não é suficientemente pequeno para que ocorra o abandono dos esforços relacionados a esta causa com o intuito de diminuir ainda mais este número, principalmente devido as complicações relacionadas à IOT e o que é pior, a re-IOT, como por exemplo o aumento do risco de pneumonia nosocomial em pacientes submetidos a re-IOT18, e ainda o resultado de piora de prognóstico em cerca de 40% a este mesmo tipo de paciente6.Foram encontrados durante o estudo limites de pesquisa, sendo um deles o baixo número de pacientes comparando este a outros estudos referentes a este assunto4,7,12,15,16, este fato pode ser relacionado a baixa rotatividade de pacientes e pequeno número de leitos da UTI utilizada como campo de pesquisa, também deve ser questionado o pequeno prazo para o desenvolvimento da pesquisa. Outro foco limitador foi a ausência da mensuração da pressão intra – "cuff" , que é sabidamente possível responsável por lesões de traquéia e laringe, porém em um estudo foi demonstrado não haver relação entre as pressões intra-"cuff" e a necessidade de re-IOT, mas deve ser ressaltado que a média geral das pressões intra-"cuff" não ultrapassou 20 cmH2O, valor que se encontra dentro da faixa de tolerância15.

Conclusão: : concluímos que o teste de escape aéreo após a desinsulflação do "cuff" endo-traqueal (" Cuff Leak Test") pode ser útil na tentativa de minimizar o número de pacientes submetidos a re-intubação e sua utilização deve ser fomentada, uma vez quer até hoje não foram encontrados resultados que o desabonassem ou situações que o dificultassem ao ponto de julgarmos desnecessário, tendo em vista que este teste apresenta simples realização e não altera a rotina de desmame e extubação dos pacientes submetidos à intubação oro-traqueal. Este teste ainda pode ser utilizado como advento para indicações de terapias antiinflamatórias pré-extubação, porém acreditamos que este assunto merece maior atenção e estudos que avaliem sua importância e possíveis conseqüências tanto positivas quanto negativas, além de esforços direcionados a melhor parametrização e padronização de procedimentos.

AGRADECIMENTOS: Agradecemos a toda a equipe da UTI geral do hospital Santa Cruz, as supervisoras do curso de especialização e aos Drs. Douglas Ferrari e Getúlio Ollé da Cruz.

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