Avaliação das causas de reintubação nas UTIs do Hospital Santa Cruz.

Autor: Giceli Girardello
CREFITO:: 3971 LTF
Cidade: São Paulo
Estado: SP
Email: gigirardello@yahoo.com.br

Instituição: Hospital Santa Cruz - Centro Formador AFIB

Orientador: Prof. Rodrigo Tadini / Prof. Solange Guizilini


Introducão: Existe diferença marcante na rapidez e eficácia do desmame ventilatório mecânico em relação às diferentes doenças etiológicas.
Entre elas, doenças pulmonares prévias, grandes cirurgias abdominais e ou torácicas e doenças neurológicas; sendo que  as de origem cardiorespiratória, são as que mais tendem a reintubação precoce.
A porcentagem da falência do desmame ou reintubação hoje de acordo com alguns trabalhos é de até 60 %. Mostra ainda que algumas causas de re -IOT devem-se à falência muscular, extubações não planejadas etc.
Vários outros fatores contribuem para o retorno à ventilação mecânica após desmame como: retenção de secreção, atelectasias, congestão pulmonar, isquemia cardíaca, broncoaspiração, nível de consciência e fadiga muscular.(CARLOS CARVALHO,2000)
Segundo CARVALHO, 2000, 5 a 30% dos pacientes apresentam dificuldade do desmame ventilatório. Este grupo correspondem à doentes especiais, sendo que, nesses casos um conhecimento profundo da etiologia que originou a intubação orotraqueal se faz necessário para um desmame adequado. Para poder atingir esta meta é preciso um conhecimento das técnicas ventilatórias e programas amplos de Fisioterapia Intensiva.
A causa fundamental do insucesso de um desmame ou re -IOT quase sempre pode ser analisada sob o ponto de vista de um desiquilíbrio entre a capacidade ventilatória diminuída e a demanda ventilatória aumentada.
A intubação orotraqueal é fundamental nos pacientes com Insuficiência Respiratória pulmonar Aguda, com o objetivo de auxiliar o suporte ventilatório, mas como é um procedimento invasivo, não é isento de complicações. Portanto, é oportuno o rápido conhecimento da reversibilidade do processo agudo para o retorno à ventilação espontânea. Tal processo é considerado por alguns intensivistas como a "arte do desmame" em situações baseadas em evidências da prática diária.(CARVALHO, 2000)
Devemos preparar o paciente que foi submetido à assistência ventilatória para que assuma de forma mais breve e segura o comando das funções respiratórias fisiológicas, evitando assim as re-IOT, o que diminui custos hospitalares e morbimortalidade.

Objetivo: Diante, destes fatos tivemos como objetivo deste trabalho verificar as causas de reintubação orotraqueal nas Unidades de Terapia Intensiva do Hospital Santa Cruz, como os fatores e complicações que predispuseram  esse evento. 

Material e método: De julho a novembro de 2003 , nas dependências das UTIs do Hospital Santa Cruz, foi realizado  estudo prospectivo, onde foram acompanhados os pacientes admitidos nas UTIs Geral, Neurológica e Coronariana, entubados via orotraqueal sob assistência ventilatória mecânica.
Foram analisados 78 pacientes, com idade média 72,2 anos, sendo  submetidos à avaliação clínica diária em relação à: causa que levou à ventilação mecânica ( Pulmonar ou Extra- Pulmonar );  tempo de ventilação mecânica; idade; número e causas das reintubações.


Resultado: Quanto à causa de IOT ( Figura 1 )
53, 84 % foram IOT por causa pulmonar
46,15 % por causa extra pulmonar

As causas de IOT, podem ainda serem classificadas: ( Figura 2 )
23,2 % cardíaca
29, 4 % neurológica associado à respiratória
47, 4 % respiratória ( 78 % por BCP )

Idade dos pacientes com óbito: ( Figura 3 )
84, 61 % dos óbitos tinham mais de 60 anos de idade.
15, 38 % dos óbitos com menos de 60 anos de idade.
Lembrando que o número de óbitos se deu em 33 % dos pacientes analisados, sendo 6, 4 % pertencentes ao grupo de Re-IOT.

Causas de Re - IOT: ( Figura 4 )
56, 8 % causa pulmonar
42, 6 % causas extra - pulmonar.

Estatística final : ( Figura 5)
33,3 %  extubados com sucesso ( c/ tempo médio de Vm de 6, 9 dias ).
33, 3 %  à óbito.
8, 9 %  Re- IOT.
24, 5 % traqueostomia.


Conclusão: Desde 1980, MACWEN descreveu pela primeira vez com sucesso o uso da ventilação mecânica artificial invasiva. Desde que foi aceito a intubação orotraqueal ( IOT ), esta tornou-se a principal intervenção em Unidades de Terapia Intensiva.
A indicação de Ventilação Mecânica tem sido discutida à muitos anos pelos profissionais intensivistas.
 EPSTEIN et al em 2000, indicou Ventilação Mecânica Invasiva (VMI) por: exacerbação de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), Pneumonia, Síndrome do Desconforto Respiratório no Adulto (SARA), Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) , descompensação cardíaca, síndrome neurológica, sangramento gastrointestinal e sepses .
No presente estudo a causa de IOT se deu de causas amplas, sendo: 23,2 % cardíaca; 29,4 % neurológica associada a causa respiratória e 47,4 % dos pacientes por causa pulmonar; Dentro das causas pulmonares 78% foram intubados por Broncopneumonia ( BCP ).
Quanto as complicações da Ventilação Mecânica a Pneumonia Nosocomial (PN) é  complicação comum, estendendo-se de 7 à 70 % dos pacientes. Alguns estudos epidemiológicos consideram que a incidência de PN durante a VM tem mostrado que 1 em cada 4 pacientes mecanicamente ventilados por mais de 72 horas desenvolveram pneumonia quando ventilados (TORRES et al., 1995).
Estudos mostram a Re-IOT um dos mais significantes fatores de risco para a PN em 47% dos pacientes .
Em relação à Re-IOT 22,4 % dos pacientes desenvolveram Pneumonia Nosocomial. ( Torres et al., 1995 )
LISTELLO et al em 1994, conclui que vários parâmetros não respiratórios foram associados com o risco de Re -IOT, como exemplo a taquicardia. E conclui que extubações não planejadas podem ter como resultados: remoção acidental do tubo durante a manipulação do paciente, movimento abrupto do paciente, ou movimento intencional do paciente. Ainda  afirma-se que 79 % das Re-IOT se dá por fadiga muscular.
Segundo BOULAIN, 1998, 60,1% dos casos de Re-IOT, se deram por extubações não planejadas.
TORRES et al em 1995, realizaram um estudo com 271 pacientes, onde 40 deles necessitaram de Re-IOT pelos seguintes motivos: vazamento (N=19); obstrução do tubo (N= 3) ; auto extubação  (N= 6); falhas no desmame (N= 12).
No presente estudo, o processo de desmame ventilatório não foi acompanhado. Porém, por existir a presença constante do Fisioterapeuta na UTI, nas dependências das Unidades de Terapia Intensiva do Hospital Santa Cruz, existe critério de desmame a ser seguido, como: Índice de Tobin; Índice de Desmame Ventilatório ( IDV ); Estabilidade Hemodinâmica; Relação PaO2/ FiO2, entre outros como, associar manobras fisioterapeuticas de desobstrução e reexpansão respiratória com o objetivo de diminuir os riscos e complicações cardiorespiratórias.Portanto, por seguir protocolo de desmame ventilatório e acompanhamento da Fisioterapia Intensiva o índice de Re-IOT foi 8,9%, tendo como referência mundial nas UTIs até 10 % de Re- IOT.
EPSTEIN et al em 1998, classificaram a causa de Re-IOT como: obstrução das VA (N=11 ); aspiração ou excesso de secreção pulmonar (N=12); insuficiência respiratória (N=21); encefalopatias (N= 7 ); e outras causas (N= 6 ).
EPSTEIN et al em 2000, incluíram como critérios de Re-IOT: aumento de trabalho respiratório; taquipnéia, uso da musculatura  acessória ventilatória e excesso de secreção.
Estudo realizado nas Unidades de Terapia Intensiva da Austrália e da Nova Zelândia, com objetivo de  relatar os pacientes que necessitaram Re-IOT para manter vias aéreas protegidas e ou ventiladas. (BECKMANN , 2001 ). Foram relatados 7.525 incidentes de IOT, identificando 241 casos de Re-IOT. Dessas 241 Re-IOT, 98 foram extubação acidental e 143 outros eventos relatados.
A incidência de Re-IOT foi identificada, como sendo de causas: tubo mal posicionado (17 %); problemas no cuff (16 %); bloqueio das VA (14 %); falhas na extubação (14 %);  conduta inadequada de extubação (33 %) entre outros.
Estudos acima citados quando comparados a este, verifica-se que o índice de causas de IOT foi semelhante aos demais trabalhos apresentados, envolvendo causas : cardíacas, neurológicas, respiratórias e mistas.
 Encontramos que a  Re-IOT por fator  pulmonar deu-se em 56,8% dos casos, sendo: fadiga respiratória associada a Broncopneumonia (14,2%); Auto extubação e Hipóxia (14,2%); Bronquiectasia (14,2%) e Broncopneumonia (14,2%).
Segundo BECHANN et al em 2001, analisaram vários estudos onde os pacientes que foram Re-IOT tiveram  maiores complicações fisiológicas. A maior parte das complicações freqüentemente relatadas são de natureza cardíaca e/ ou respiratória.
  Há uma tendência em relação à uma larga mortalidade entre os pacientes que requerem Re-IOT, um total de 28 % (BECHMANN et al., 2001).
Seudal et al em 1992, realizaram um estudo sobre a mortalidade nas Re-IOT, que concluíram significativo  mortalidade do grupo de Re-IOT( 23 % ), apesar de haver similarmente doenças agudas e crônicas.
Epstein et al 1998, mostrou que pacientes que necessitavam de  Re-IOT, depois da falha na extubação, tiveram pior prognóstico, com mortalidade excedendo 30 - 40 % .
No presente estudo, a mortalidade ficou em torno de 30% dos pacientes analisados, sendo 6,4% pertencentes ao grupo dos pacientes Re-IOT. Dos pacientes Re-IOT 100% eram cronicamente acometidos.
Outros estudos mostram que 74% dos pacientes necessitaram Re-IOT imediata (1 hora) e 26 % em 12 horas.  ( EPSTEIN et al ., 1995 )
Estes autores apresentaram 2 estudos recentes, onde  encontraram que os pacientes com Re-IOTem 12 horas de extubação tiveram mortalidade menor quando comparados aqueles que foram Re-IOT depois de 12 horas. Essa afirmação é comprovada por um relato  no estudo de Epstein et al, onde afirmam que o efeito do tempo de Re-IOT, sugere a identificação precoce dos pacientes depois da extubação e oportuna reinstituição do suporte ventilatório, teve um potencial significativo na redução da mortalidade. "  ( EPSTEIN et al ., 1995 )
Em controvérsia, em nosso estudo 56, 8 % dos casos que necessitaram suporte ventilatório nas primeiras 24 horas.Porém, tal conduta não alterou a sobrevida desses pacientes em relação aqueles que foram Re-IOT em até 96 horas pós extubação ( 43,2 %).
Concluímos que o índice de Re-IOT nas Unidades de Terapia Intensiva do Hospital Santa Cruz é menor  em relação ao encontrado na literatura mundial, assim como a causa de Re-IOT por fadiga muscular também é menor. Quanto ao índice de mortalidade, este se enquadrou abaixo dos índices referenciais mundiais, apesar da média de idade ser elevada.
Podemos atribuir que estes resultados foram devido ao trabalho de toda equipe multidisciplinar, como atuação constante da Fisioterapia Intensiva monitorizando critérios específicos de desmame ventilatório.


Bibliografia:

BECKMANN,.U; MD,. B; GILLIES,. D; Factors Associated With Reintubation in Intensive Care; CHEST, augusr 2001.

BOULAIN,. T; and the Association des Reanimateurs du Centre Quest; Unplanned Extubations in the Adult Intensive Care Unit. AMERICAN JOURNAL OF RESPIRATORY AND CRITICAL CARE MEDICINE Vol 157, 1998.

CARVALHO,. C; Ventilação Mecânica Avançada;  Ano 5 Vol 9; Atheneu 2000.

EPSTEIN,. S; NEVINS,. M; CHUNG,. J; Effect of Unplanned Extubation on Outcome of Mechanical Ventilation; AMERICAN JOURNAL RESPIRATORY AND CRITICAL CARE MEDICINE Vol 161, Number 6, june 2000.

 KNOBELL,. E; Condutas no paciente grave; Vol I e II; Atheneu, 2ª. edição 1998.


LISTELLO,. D; SESSLER,. C Unplanned Extubation. CHEST: .may .1994.

SCOTT,. K; EPSTEIN,.S; CIUBOTARU,.R; Independent Effects of Etiology of Failure and Time to Reintubation on Outcome for Patientes Failing Extubation; AMERICAN JOURNAL OF RESPIRATORY AND CRITICAL CARE MEDICINE; Vol 158 1998.

TORRES,.A; GATELL,. J; AZNAR,. E; EBIARY,. M; BELLACASA,. J; GONZÁLEZ,. J; GONZÁLEZ,. j; FERRER,. M; ROISIN,. R. Re- intubation Increases the Risk of Nosocomial Pneumonia um patientes Needing Mechanical Ventilation . AMERICAN JOURNAL OF RESPIRATORY AND CRITICAL CARE MEDICINE; Vol 152, 1995.